quarta-feira, 14 de junho de 2017

Coluna Claquete - Filme da Semana: “Uma Agente Muito Louca”



 

Newton Ramalho

 

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Filme da Semana: “Uma Agente Muito Louca”

Considerando o cinema de bom nível de qualidade, a França hoje é o país europeu que mais produz filmes, depois de Hollywood. São inúmeros os casos onde produções francesas foram refilmadas pela indústria americana, tão bons eram estes filmes. Contudo, observa-se, de vez em quando, uma inversão na balança, e surgem no mercado filmes como “Uma Agente Muito Louca” (“Raid Dingue”, 2016), uma clara adaptação dos besteiróis americanos.
O filme conta a história de Johanna Pasquali (Alice Pol), uma jovem policial que sonha fazer parte de um corpo de elite da polícia francesa, o grupo RAID. O problema é que a moça, apesar de ser muito esforçada e idealista, é completamente desajeitada, o que lhe causa grandes problemas.
Quando ela diz ao noivo (Patrick Mille) que em função da recusa em ser aceita no RAID, ela vai alistar-se na Legião Estrangeira, o pai (Michel Blanc), que é o Ministro da Justiça, força a barra para que a moça seja aceita no programa de treinamento da RAID.
Johanna fica aos cuidados do veterano Eugène Frossard (Dany Boon), que vive uma fase ruim depois que a mulher o deixou para fugir com o irmão dele. Entre as confusões em que a moça se envolve, e as constantes ações do grupo, começa a existir uma atração entre os dois, contra a vontade de Frossard.
Enquanto Johanna permeia no meio de uma rixa entre o comandante do RAID (François Levantal) e o pai da moça, tudo caminha para um grande atentado terrorista que – acredite quem quiser – só ela foi capaz de perceber.
Não gostei da parte cômica do filme, que resume-se a situações inverossímeis e caretas de Alice Pol, mas o gênero besteirol tem legiões de fãs que certamente irão se deliciar, como o fizeram em “Se Beber Não Case”, “Um Parto de Viagem” e outras pérolas.
Os amantes de filmes de ação poderão apreciar boas cenas, em especial o clímax, bem recheado de tiros e explosões.
Faz pena ver grandes atores desperdiçados, todos eles protagonistas de grandes filmes no passado, como Dany Boon e François Levantal, mas, em especial Yvan Attal, um dos maiores nomes do cinema francês contemporâneo, que vive aqui um vilão mais ridículo do que o de Javier Bardem em “007 – Operação Skyfall”.
“Uma Agente Muito Louca” está na programação do Festival Varilux de Cinema Francês 2017, que estreia esta semana em várias cidades brasileiras.

Título Original: “RAID Dingue”

Coluna Claquete - Filme da Semana: “Amanhã”




 

Newton Ramalho

 

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 Filme da Semana: “Amanhã”


Sempre que se faz algum documentário sobre a degradação ambiental no mundo, e seus efeitos sobre a população, é utilizado um formato de denúncia, para despertar a atenção para a gravidade do problema. Por isso, é uma grata surpresa ver um documentário como “Amanhã” (“Demain Le Film”, 2015), que nos dá uma visão totalmente diferente, mostrando casos bem sucedidos de soluções implementadas.
Ao tomar conhecimento de um estudo de 21 cientistas na revista Nature, onde se mostrava que as alterações climáticas, degradação da Terra e crescimento da população caminhavam para níveis críticos, um grupo de amigos ligados ao cinema decidiu tomar uma atitude, analisando a situação e expondo-a através de sua linguagem.
Sem ser ambientalistas ou cientistas, mas pais preocupados com o futuro de seus filhos, eles percorreram o mundo, buscando soluções encontradas por pessoas normais, sem ligação com empresas, bancos ou governos.
Dispondo de um vasto material coletado em suas viagens, o grupo organizou o documentário em cinco abordagens diferentes: Agricultura, Energia, Economia, Democracia e Educação.
Ao analisar a Agricultura, constataram que a maior parte do solo hoje é ocupado pelas grandes corporações em monoculturas, tipo soja ou cana de açúcar, que empobrecem o solo e são extremamente ineficientes na produção de alimentos. Por outro lado, são mostrados inúmeros exemplos de produção de alimentos em pequenos espaços com alta produtividade, tirando proveito da diversidade, que é como acontece na natureza.
No capítulo sobre energia, é mostrado como os combustíveis fósseis, petróleo e carvão, são onipresentes em todos os aspectos da vida moderna, contribuindo para o aquecimento global. Por outro lado, lugares como a Ilha da Reunião, Suécia e Islândia adotam cada vez mais as fontes de energia alternativas, como o sol, o vento e a água, estabelecendo metas ousadas para livrar-se dos combustíveis fósseis, e mesmo da perigosa opção nuclear.
No capítulo economia, algumas noções óbvias – e desconhecidas da maioria da população – despertam o alerta para a nossa dependência dos grandes conglomerados bancários, e suas nefastas consequências, como foi visto nas recentes crises mundiais. O filme mostra como soluções que privilegiam a economia local são importantes na geração de emprego e circulação de mercadorias.
Ao explorar a democracia, vemos que aquilo que pensamos ser uma forma democrática de governar, na verdade é a relação - muitas vezes espúria - de um grupo de políticos eleitos com poderosos grupos econômicos, poucas vezes resultando em algo benéfico para a população. São mostrados exemplos bem sucedidos na Índia e na Islândia onde resultados inimagináveis foram alcançados, partindo da conscientização do povo e de sua participação ativa no destino de sua cidade, região ou país.
Por fim, ao estudar a educação, o grupo buscou o país que é reconhecido como tendo o melhor sistema educacional do mundo, a Finlândia. Apesar de ser um país com um clima severo e sem grandes recursos naturais, o sistema educacional é elogiado em todo o mundo. E, revela-se aqui que não existem recursos tecnológicos ou de outra natureza. O que se vê são classes com poucos alunos e mais de um professor, todos com anos de universidade e experiência assistida, pouca fiscalização e muita responsabilidade, além de uma ótima relação entre dirigentes, professores e alunos – além da gratuidade do ensino, é claro.
O filme é extremamente bem feito, com fotografia, música e edição primorosos, sem nenhum aspecto apelativo, e ao mesmo tempo fugindo da monotonia de um documentário tradicional. “Amanhã” ganhou o César (o Oscar francês) de Melhor Filme-Documentário, Melhor Diretor (Cyril Dion e Mélanie Laurent), e Produção (Bruno Levy).
É difícil não sentir uma grande dose de esperança ao ver este documentário, principalmente ao saber que não são apenas as soluções mostradas no filme que estão em andamento. Milhares de cidades estão adotando soluções alternativas para fazer a sua parte e reverter o destino perverso que nós mesmos criamos.
E para quem ficou interessado, duas boas notícias: “Amanhã” está na programação do Festival Varilux de Cinema Francês de 2017 que acontece a partir de 8 de junho próximo, e para os que não conseguirem ver na tela grande, é possível encontrá-lo no catálogo da Netflix brasileira.

Coluna Claquete - Resenha do documentário “Cais do Sertão”




Resenha do documentário “Cais do Sertão”



Oriundo que sou das plagas paraibanas, até o final dos anos 70 não sabia nada de Natal, a não ser o título de “capital espacial do Brasil”, e - vejam só - a feira do Alecrim, comparável às suas congêneres de Caruaru e Campina Grande. Três décadas depois, radicado como papa-jerimum, tenho a honra de comentar o documentário “Cais do Sertão”, sobre o bairro do Alecrim, que considero o mais interessante da cidade.
O bairro do Alecrim sempre fez parte da minha vida, embora eu nunca tenha morado lá. Mas, foi lá que me hospedei, nos primeiros dias em que vim morar em definitivo, foi onde a filharada estudou, no tradicional Colégio da Neves, o primeiro e o único jogo de futebol que assisti no saudoso Castelão, foi América e Alecrim, e foi naquele emaranhado de ruas e avenidas que sempre busquei a solução de muitos problemas domésticos e veiculares.
Acredito que, como eu, muitos natalenses pensam no Alecrim como o primeiro lugar para encontrar o que não existe ou é difícil em outros bairros da cidade. Peças de carro, oficinas, acessórios eletrônicos, tecidos, móveis, discos e livros usados, quinquilharias chinesas, calçados de todos os tipos, produtos e ferramentas agrícolas, camisas da seleção, etc., etc..
Mas, o que talvez mais expresse o amor pelo bairro seja o prazer de, simplesmente, passear erraticamente pelas ruas, largas ou estreitas, retas ou tortuosas, olhando produtos que nunca se vai usar, ou, fazer uma “feira” nas lojas de 1,99, comprando coisas que nunca funcionarão ou que mal resistem à primeira utilização.
Esse espírito do amor ao bairro, foi magnificamente capturado pelo diretor e jornalista Paulo Laguardia em seu documentário “Cais do Sertão”, por ocasião do centenário do mesmo, onde conseguiu, em 52 minutos primorosos, montar uma visão caleidoscópica do Alecrim, através de depoimentos de moradores, artistas, pesquisadores, comerciantes, e muitos outros.
Nele descobrimos, por exemplo, que o Alecrim era o ponto de ligação entre o que vinha de fora e o interior do estado, daí o apelido “Cais do Sertão”. Outra coisa curiosa foi saber que, ao contrário do que muitos imaginam, a nomenclatura das ruas e avenidas por números foi anterior à vinda dos americanos na Segunda Guerra Mundial.
Com uma edição dinâmica, o que poderia ser um desenrolar monótono de opiniões formou uma bela colcha de retalhos explorando as origens do bairro, sua opulência cultural com cinemas, teatros e bares boêmios tradicionais, os grupos carnavalescos, e a importância para o comércio da cidade e do estado.
Mas, o documentário não se furtou a discutir os problemas que persistem, como a progressiva eliminação das áreas verdes, o embate entre o comércio tradicional e os camelôs, o trânsito cada vez mais engarrafado e o reduzido espaço para circulação.
“Cais do Sertão” é um belo retrato daquele que é talvez o lugar mais representativo de Natal, fora dos estereótipos de praias e dunas, que apenas os verdadeiros natalenses – natos ou adotados – conseguem reconhecer.

Coluna Claquete - Filme da Semana: “Cantinflas: A Magia da Comédia”




 

Newton Ramalho

 

 

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 Filme da Semana: “Cantinflas: A Magia da Comédia”


Antes da disseminação da televisão, o cinema reinava absoluto como “a melhor diversão”, e após a Segunda Guerra Mundial, a hegemonia de Hollywood era imbatível em todo o mundo. Isso também alimentava uma guerra fratricida entre os grandes estúdios e a United Artists, uma associação de atores encabeçada por Charles Chaplin, Mary Pickford e outros companheiros.
É nesse momento, em 1955, quando as superproduções se anunciavam, e os espectadores aguardavam ansiosos as estreias de “Os Dez Mandamentos”, da Paramount, “Assim Caminha a Humanidade”, da Warner, e “O Rei e Eu”, da Fox. A United Artists patinava, sem conseguir fazer andar o ambicioso projeto de Mike Todd, “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”, baseado no famoso livro de Júlio Verne.
O problema maior era que Todd, além de ter pouco dinheiro disponível, ainda queria incluir grandes nomes internacionais interpretando pequenos papéis no filme. Claro que num mundo extremamente capitalista, nenhum ator famoso de Hollywood tinha o menor interesse nisso.
Uma das pessoas cogitadas por Todd era o comediante mexicano Mario Moreno, conhecido como Cantinflas. Como a maioria dos americanos, acostumados a enxergar apenas o próprio umbigo, Todd sabia pouco sobre ele, além de ser famoso em seu país. Como não lhe restavam mais opções, decide viajar até o México para apresentar-lhe seu projeto e convidá-lo para participar dele.
Ao saber que teria apenas um pequeno papel, de um cacique de uma tribo americana, e que a cena seria filmada nos Estados Unidos, o ator mexicano recusa de imediato. Derrotado, Todd volta para Hollywood acreditando que seu projeto vai acabar antes de começar.
Ao longo do filme, através de inúmeros flashbacks, o espectador vai conhecendo a história de Moreno, um homem de origem humilde, que sonhava em ser boxeador, e ao trabalhar em um pequeno teatro de variedades revelou um notável talento para comédia e improvisação.
Naquele momento, Moreno, que iniciara a carreira com o personagem “El Peladito”, o mexicano pobre e esperto, que sempre conseguia escapar das piores situações de uma forma cômica, e que tinha fácil identificação com a maioria das pessoas pobres do mundo. É fácil perceber que a inspiração veio do vagabundo de Chaplin.
A origem do nome Cantinflas tem várias teorias, nenhuma totalmente comprovada, mas uma delas é mostrada no filme, quando um espectador bêbado ficou gritando “en qué cantina inflas?” (em que bar você fica bêbado). Apesar da interrupção, Moreno gostou do som, e adotou o nome artístico de Cantinflas. Um reflexo de sua fama é a existência do verbo “cantinflear”, que significa falar muito e não dizer nada.
Lutando contra as dificuldades da profissão, e contra o corporativismo da indústria de entretenimento em seu país, logrou criar uma associação independente de atores, livre da corrupção reinante no meio.
Quando Todd o procurou, Moreno já era um homem milionário, extremamente bem sucedido na profissão, havia feito dezenas de filmes, não apenas atuando como comediante, mas também produzindo, escrevendo e cantando em muitos deles.
O filme também mostra a complicada relação com a única mulher do ator, Valentina Ivanova, e a dificuldade de conciliar uma vida conjugal com o assédio dos fãs e a eterna luta com as corporações.
A entrada de Cantinflas no elenco de “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” não só garantiu o financiamento do filme, como se tornou um dos maiores atrativos para o público da América Latina, que o adorava. Mas, mesmo ante o sucesso do filme, Hollywood não aceitaria Cantinflas, que voltou para seu público fiel.
O filme, estrelado por David Niven, Cantinflas e Shirley MacLaine, ganhou cinco Oscars (Melhor Filme, Roteiro Adaptado, Fotografia, Edição e Canção), sendo ainda indicado para Diretor, Direção de Arte e Figurino. O filme ainda renderia o Globo de Ouro de Melhor Ator, para Cantinflas, e de Melhor Filme no gênero Drama.
Uma curiosidade para nós, brasileiros, é que “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” foi a primeira superprodução exibida em horário nobre após a inauguração da transmissão de televisão em cores no nosso país.
Mario Moreno morreu em 1993, aos 81 anos, deixando como legado não apenas mais de cinquenta títulos no cinema, como também uma grande obra beneficente, e uma dedicação à sua pátria como poucos o fizeram.
“Cantinflas: A Magia da Comédia”, além de resgatar este personagem de grande importância para o cinema mexicano e mundial, é uma produção muito bem feita, com um roteiro inteligente, que conduz duas linhas de história até sua convergência.
O filme traz uma boa recriação de época, e reúne um elenco com notável semelhança com os personagens originais, destacando-se o ator Óscar Jaenada, que além do físico, reproduz com fidelidade os trejeitos e falas do inesquecível Peladito.
Recomendo a todos que procurem o filme, pois além resgatar um personagem notável, traz também de volta às nossas memórias afetivas um tempo em que se fazia humor com uma malícia inocente, vividas por outros grandes comediantes como Chaplin, os irmãos Marx, Harold Lloyd, e aqui no Brasil, Mazzaropi e Renato Aragão.
E, um último lembrete: não desligue imediatamente após o final, nos créditos e mostrado um hilário balé protagonizado por Jaenada e Aranzta Muñoz ao som do Bolero de Ravel!