quinta-feira, 22 de março de 2018

Coluna Claquete - Filme da Semana: "Cowboys do Espaço"





Newton Ramalho

 

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Filme da Semana: “Cowboys do Espaço”

Idosos fora de órbita

Um problema que todos irão enfrentar um dia é a dita “melhor idade”. O que fazer, e, principalmente, o que não se pode fazer, torna-se a maior incógnita. Esse assunto é tratado de forma divertida e bem-humorada no filme “Cowboys do Espaço” (“Space Cowboys”, EUA, 2000), dirigido, produzido e estrelado por Clint Eastwood.
A história inicia em 1958, quando um grupo de jovens oficiais da força aérea americana testa os inovadores aviões-foguetes X-1 e X-2, nos primórdios da exploração espacial. Em virtude de disputas pessoais, influências políticas, e outros azares, o grupo é desfeito, e a recém-criada NASA, um consórcio civil, passa a administrar o programa espacial americano.
Quatro décadas depois, já no clima de cooperação pós-Guerra Fria, os russos pedem ajuda aos americanos, para resgatar o único satélite de comunicações do país, que entrara em uma perigosa rota de colisão com a Terra.
Fruto da espionagem científica, este satélite é uma cópia do Skylab, artefato americano lançado ao espaço no início dos anos 70. Para desgosto do gerente da NASA Bob Gerson (James Cromwell), a única pessoa que entende do sistema utilizado no satélite é Frank Corvin (Eastwood), seu ex-subordinado do Projeto Dédalus. Vendo a chance de realizar seu sonho de ir ao espaço, Corvin usa um pouco de chantagem, convencendo a NASA a enviar sua equipe original, de quarenta anos atrás.
Nessa altura do campeonato, Hawk Hawkins (Tommy Lee Jones) fazia acrobacias aéreas para viver, Jerry O'Neil (Donald Sutherland) testava montanhas-russas, e, Tank Sullivan (James Garner), virara pastor protestante. Não foi preciso muita argumentação para convencê-los a voltar à ativa.
Com muito bom-humor, o filme mostra o treinamento dos “novos” astronautas, suas rivalidades com os jovens profissionais, além dos conflitos não resolvidos do grupo, mesmo após quarenta anos...
Como todo bom filme de ação, o clímax desenrola-se no terço final, numa sucessão de acontecimentos surpreendentes, em plena órbita da Terra. Não é preciso dizer que os efeitos especiais, e as imagens, são absolutamente estonteantes. O final é apoteótico, com uma belíssima paisagem lunar, e a imagem de um astronauta admirando a Terra, ao som de “Fly me into the moon”, clássica canção de jazz interpretada magicamente por Frank Sinatra.
Como foi mencionado, no início, o filme toca em um tema delicado, que começa a tomar uma importância cada vez maior, nos dias de hoje. Além da média de idade da população crescer continuamente, os idosos passam a ter uma importância cada vez maior, no sustento das famílias. Em recente pesquisa do IBGE, mostrou-se que quase um terço das famílias dependem de aposentados para sobreviver.
No filme, apesar de serem quatro pessoas diferentes, Eastwood mostrou uma visão otimista da terceira idade, com facetas diferentes, como se fossem faces de um único cubo. Corvin, engenheiro produtivo, mantinha-se ativo e sempre a par dos avanços da profissão; Hawk, piloto arrojado, só mudara o tipo de aeronave, usando velhos monomotores para manter a adrenalina alta; O’Neil, dividia o tempo entre os testes nas montanhas-russas e os galanteios às mulheres; Tank, voltara-se para a espiritualidade oferecida pela religião.
Certa vez, escutei um palestrante afirmar que a diferença entre ser velho, e ser idoso, é que o último tem a idade, mas não perdeu a capacidade de aprender e se adaptar. Eastwood parece ser a prova viva disso, e continua a dirigir ótimos filmes, mesmo com 87 anos de vida. “Cowboys do Espaço” ilustra bem essa visão, com galhardia e bom-humor, mesmo que tenha que recorrer a alguns chavões, e situações inverossímeis.
“Cowboys do Espaço” é um filme interessante para assistir com a família, os amigos, ou, mesmo sozinho, principalmente para pensar na própria existência, e refletir sobre os dias que virão.

Título original: “Space Cowboys”

sexta-feira, 16 de março de 2018

Coluna Claquete - Filme da Semana: "A Grande Jogada"




Newton Ramalho

 

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Filme da Semana: “A Grande Jogada”

A princesa do pôquer

É curioso como para Hollywood, o valor mais importante parece ser o dinheiro. Pelo menos é assim, onde os heróis não são apenas os que fazem bem para a Humanidade, mas os que ficam ricos de maneira pouco ortodoxa. Às vezes, os heróis não se dão muito bem, mas a história deles ainda parece atraente, como é o caso de Molly Bloom em “A Grande Jogada” (“Molly’s Game”, EUA, 2017).
Molly (Jessica Chastain) é uma garota do Colorado, de uma família de classe média alta, onde todos pareciam ser dotados de qualidades especiais. Um dos irmãos formou-se em medicina e fez residência em Harvard, tornando-se um brilhante cirurgião. O outro, um prodígio no esqui, foi durante muito tempo o número um da América.
Impulsionada pelo pai (Kevin Costner), que exigia muito desempenho dos filhos, tanto nos estudos quanto nos esportes, Molly também teve seus quinze minutos de fama, mesmo passando por uma delicada cirurgia de correção da coluna, ainda adolescente. Ela ainda conseguiu bons resultados na equipe nacional de esqui, mas teve que largar ao perceber que na teria futuro no esporte.
Como fazem muitos jovens americanos, ela resolveu tirar um ano sabático antes de prosseguir na universidade, e foi viver esse tempo na Califórnia. Como lá ninguém precisa de vestibular ou ENEM, é possível fazer essas façanhas, pois o que importa é o dinheiro para pagar a universidade – e que não é pouco.
Mesmo contra a vontade dos pais, Molly foi viver o seu sonho californiano, e um emprego de garçonete a levou a trabalhar com um empresário que organizava jogos de pôquer. Isso não seria novidade num país onde existem cassinos de monte – e jogos clandestinos em cada esquina. Mas, o diferencial desse jogo eram os participantes, todos ricos e famosos.
Molly fica deslumbrada com o que vê, não apenas atores famosos como Tobey Maguire, Leonardo DiCaprio (que jogava sempre com fones de ouvido), Ben Affleck, mas também a quantidade inimaginável de dinheiro trocando de mãos como se fosse a coisa mais natural do mundo. Só de gorjeta, ela ganhara muito mais do que o seu salário.
É nesse momento que ela decide fazer parte desse mundo, mesmo não sendo milionária, mas organizando e orquestrando esses jogos à sua maneira, com todos os requintes que essas pessoas estavam acostumadas.
Depois de algum tempo ela assume o jogo dos milhões, tendo que lidar tanto com os egos superinflados dos famosos, quanto de cobrar e pagar as apostas, ao mesmo tempo em que se afasta cada vez mais da família e dos amigos. Ela passa a ser conhecida como a Princesa do Pôquer, entre os inúmeros apelidos, nem sempre tão lisonjeiros.
Não demora muito para que o jogo desperte a atenção de todos, e um dos “novos amigos” decida afastá-la da jogada. Impotente, Molly decide mudar de ares, e volta os olhos para Nova York, onde um mercado latente a espera.
Muito mais experiente e com uma rede impressionante de contatos, Molly aproxima-se de novos jogadores muito mais poderosos do que os que lidava antes. Como ela diz em seu livro, em Las Vegas estão os atores e diretores de filmes, mas, em Nova York estão as pessoas que financiam estes filmes.
O problema é que, quanto mais altas as apostas, mais perigoso fica sustentar o jogo, principalmente se a pessoa não quer envolver-se com o crime. Mas, nem sempre querer é poder, e a máfia russa logo “propõe” fazer parte do esquema de Molly. Não demora muito para Molly ser presa, junto com mais uma centena de pessoas acusadas de participar de um sistema de jogos ilegais em conluio com a máfia russa.
O livro termina neste ponto, mas o filme avança um pouco mais, explorando o processo que ela sofreu e a decisão surpreendente do juiz. Curiosamente, ela é mostrada como uma eficiente empresária, que construiu do nada e quase sem ajuda um negócio que movimentava milhões de dólares.
Em seu livro Molly foi bem mais sincera, nomeando os personagens com os quais ela convivia em seu “negócio”, e as atitudes e reações de cada um. Segundo ela, o que a motivou a permanecer com o jogo foi a oportunidade de vivenciar, mesmo que de carona, de uma vida de prazeres requintados reservados aos bilionários. Isso, mesmo à custa do afastamento da família, namorados e amigos.
O filme é extremamente bem feito, e o diretor Aaron Sorkin, um veterano roteirista, foi também o responsável pela adaptação do livro de Molly para as telas, o que lhe rendeu uma indicação ao Oscar 2018 na categoria Roteiro Adaptado. O ritmo é ágil, e o elenco muito bom. Claro que muitos nomes foram trocados, pois estava se tratando de pessoas de Hollywood.
Talvez para o espectador essa história pertença a um universo muito distante, o estratosférico mundo dos ricos e famosos, mas a ambição, cobiça, e o amor da família são valores que transcendem as classes sociais, e fazem parte da natureza humana. Esta, ao final, é a mensagem que Molly nos transmite.

Título original: “Molly’s Game”

segunda-feira, 12 de março de 2018

Coluna Claquete - Especial: Legendas, para que te quero?




Newton Ramalho

 

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Especial: Legendas, para que te quero?




É muito difícil que alguém nunca tenha se deparado com uma legenda de filme ou programa na vida. É bem verdade que os iletrados ou os fanáticos por televisão poucas vezes irão utilizá-las, os primeiros por lhes faltar a habilidade para ler, os segundos, por pura preguiça mental, sujeitando-se a engolir o que quer que a programação da telinha lhes seja oferecida.
Já para os frequentadores dos cinemas, é uma outra história. A imensa maioria dos filmes que passam em nossas salas são oriundos de Hollywood, e, a não ser os blockbusters, mantém o áudio original, geralmente em inglês, e portam as legendas em português.
Para a minha geração – hoje tenho 61 anos – a legenda era uma opção, digamos, obrigatória. Como a televisão era coisa de ricos, e o cinema ainda era “a melhor diversão”, o grande entretenimento era mesmo a programação da telona, o que explicava a presença de uma ou mais salas em qualquer cidade, mesmo no interior da Paraíba, onde passei a minha infância.
Os filmes dublados – para o cinema – eram raros. Se não fosse uma produção nacional, as exceções ficavam por conta de raros desenhos animados ou algum clássico tipo “Ben-Hur” ou “Rei dos Reis”. A esmagadora maioria dos filmes eram produções estrangeiras, americanas ou européias, todas, cuidadosamente legendadas.
A televisão quebrou muito este paradigma, a partir da sua expansão, notadamente na década de 1970, quando as redes Tupy, e depois a Globo, difundiram a sua programação pelo país, incluído aí os filmes, sempre dublados.
Com o advento do videocassete, criou-se uma situação estranha. Todos os filmes eram lançados em duas versões, uma dublada em português e a outra com o áudio original, a versão legendada. Imaginem a minha frustração ao chegar à locadora e deparar com um filme há muito desejado, e descobrir que só havia a opção dublada!
Posteriormente, com o lançamento do DVD, parecia que o céu se abrira para o usuário doméstico. Além de não precisar rebobinar a fita, o disco prateado permitia escolher o áudio e a legenda que se desejasse. Era a solução para gregos e troianos, a democracia eletrônica para os amantes de cinema. Mas, como nem tudo é perfeito, nem todos os filmes eram lançados com a dublagem em português, e os discos comprados no exterior raramente tinham as legendas tupiniquim. Mais uma vez, alguém ficava insatisfeito.
Novas ondas de evolução passaram, os cinemas se elitizaram, e o DVD pirata reinou absoluto um bom tempo, pouco afetado pela chegada do Blu-Ray. Mas, um novo meio de transmissão de filmes chegou, graças ao aumento de velocidade na internet. Os programas de troca de arquivo torrent possibilitaram o acesso de filmes de todos os cantos do planeta, muitos deles poucas horas após terem sido lançados.
Quando um filme destes é colocado na rede, pode ter sido por uma cópia dentro de uma sala de cinema – o que garante uma imagem péssima e som praticamente inaudível – ou de um lançamento em DVD ou Blu-Ray. Este processo é chamado “ripar”, termo que vem do inglês rip, que significa rasgar ou arrancar. O sentido é esse mesmo, na prática se faz uma cópia digital, geralmente em um arquivo de vídeo, para poder assistir no computador, nos aparelhos de DVD e Blu-Ray, smart TV e até mesmo em tabletes e smartphones.
Ao ripar um DVD nacional, o cidadão pode fazer uma cópia também das legendas. Ao fazer isso, ele criará um arquivo para cada idioma de legenda. Existem vários formatos de arquivos de legendas, o mais comum é o de extensão SRT, que vem do inglês SubRip SubTitle. Este arquivo nada mais é do que um arquivo texto, com a linha de cada fala, o tempo de início e de final da mesma.
Como essa troca de arquivos de filmes é um passatempo mundial, e os títulos disponibilizados podem vir de lugares como Coréia do Sul, Turquia, Romênia, etc., nem sempre existem legendas em português para eles.
Esse problema é resolvido como a maioria das coisas na internet hoje em dia: alguém faz e disponibiliza para os demais usuários. Existem sites na internet onde é possível encontrar legendas para os mais diversos filmes e seriados, e muitas dessas legendas não são ripadas de DVD ou Blu-Ray, mas sim criadas por pessoas normais, como eu e você, caro leitor.
Pesquisando na internet descobri filmes antigos e raros, para os quais algum cidadão se deu ao trabalho de pesquisar e montar as legendas, oferecendo-as depois, para o mundo, a troco de absolutamente nada – ou do simples prazer de fazê-las.
Curioso sobre esse novo mundo, procurei saber as origens dessas legendas. Além das que são ripadas de discos, muitas delas são traduzidas a partir de uma legenda em outra língua, e, em alguns casos, a tradução é feita a partir do áudio original, o que é um processo muito, muito mais difícil.
Decidido a fazer uma experiência, procurei um filme que não tivesse nenhuma legenda em português. O escolhido foi “Conto de Outono”, uma produção francesa de 1998, do diretor Eric Rohmer, que jamais havia sido lançado no Brasil em DVD – e dificilmente o será.
Dispondo de uma legenda em inglês e outra em francês, fui traduzindo, linha por linha, num trabalho que levou uma semana, já que era feito nas horas vagas. Ao cabo do trabalho, fui testar o resultado, e tive uma certa decepção, pois a legenda estava fora de sincronismo.
Com um pouco mais de pesquisa, descobri um programa que conseguia corrigir o sincronismo. Na verdade existem duas maneiras de ajustar a legenda ao momento correto do filme. O mais simples é quando precisamos apenas adiantar ou atrasar a legenda, arrastando todo o conjunto alguns segundos para frente ou para trás.
Mas, o mais complicado é quando a legenda foi feita para uma versão com um tempo maior ou menor. Para corrigir isso, é preciso estreitar ou aumentar o tempo entre as legendas, para chegar ao sincronismo perfeito. Com um pouco de prática, e uma legenda no tempo correto, esse ajuste é feito em segundos.
Ao final de tudo, além da sensação de ter feito algo diferente, resta apenas a certeza de que aquela legenda irá facilitar a vida de alguém, em algum lugar do mundo, que queira assistir o filme com os dizeres em português.
É bom salientar que, ao fazer uma legenda, não se está fazendo uma atividade pirata ou ilegal. Mais que tudo, é um belo exercício de prática de língua estrangeira, onde se trabalha quase sempre com linguagem oral e cotidiana. Essas legendas fazem mais pela universalização do cinema do que qualquer programa governamental ou internacional. Além do mais, para alguém que tenha deficiência auditiva, a legenda é algo obrigatório!
O fato da legenda ser feita por pessoas não profissionais não quer dizer que seja algo malfeito. Afinal de contas, já verifiquei muitas legendas – profissionais - em VHS ou DVD com erros absurdos, traduzindo world (mundo) por word (palavra), ou dizendo “Você está queimando!”, quando o cidadão era despedido com um sonoro “You are fired”...
Hoje em dia, a universalização de serviços como Netflix e similares já permite um maior acesso a filmes dublados ou legendados com boa qualidade, embora a oferta tenha limitações. Contudo, a comodidade de não precisar comprar ou alugar um disco físico, ou mesmo baixar da internet já deixa muita gente feliz.