Newton Ramalho
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Filme da Semana:
“Uma Dama de Óculos Escuros Com uma Arma no Carro”
A lógica de distribuição de filmes
no Brasil sempre privilegia os produtos de Hollywood em detrimento de outros,
digamos, menos rentáveis. Isso nos impede de ter acesso a filmes interessantes
como a produção belgo-francesa “Uma Dama de Óculos Escuros Com uma Arma no
Carro”.
Esse estranho e longo título já
suscita no espectador alguma desconfiança sobre o tema do filme, com certeza,
uma trama policial. Mas, além de uma esperada história cheia de reviravoltas, o
filme também traz uma edição interessante, que cria expectativas e desperta
dúvidas no espectador sobre o que realmente está acontecendo.
A personagem do título é Dany
Dorémus (Freya Mavor) uma tímida secretária de uma agência de publicidade parisiense,
no início da década de 1970. Dany, embora jovem e bonita, é ridicularizada
pelas colegas de trabalho pela total ausência de vida social.
Dany tem uma queda pelo patrão,
Michel (Benjamin Biolay), que fora fisgado pela antiga colega de apartamento, Anita
(Stacy Martin). Anita e Michel eram casados e tinham uma filha.
Um dia, Michel solicita a Dany que
datilografe para ele um relatório importante. Como é um relatório grande, ele
pede que ela o faça na casa dele, já que terá que trabalhar boa parte da noite.
Assim, diz ele, ela também terá a chance de rever a amiga.
Dany aceita o pedido, e passa a
maior parte da noite envolvida no trabalho. No dia seguinte, mais um pedido de
Michel: ele quer que a jovem os deixe no aeroporto e traga o carro de volta para
a mansão.
Embora ache tudo aquilo estranho,
Dany aceita a incumbência. Contudo, após deixar a família no aeroporto, a jovem
decide aproveitar que está com um supercarro à disposição, e faz uma viagem não
autorizada para o sul da França, para realizar o sonho de ver o mar pela
primeira vez.
O que parecia ser uma simples
travessura começa a tomar forma de mistério e ameaça, pois todos parecem
conhecê-la pelo nome, ela é agredida, roubada e intimidada, e o cúmulo acontece
quando ela descobre que existe um cadáver no porta-malas. Embora ela saiba
exatamente onde estivera na noite anterior, ela mesma começa a duvidar da
própria sanidade ante tantas evidências estranhas.
Este roteiro, muito bem escrito por
Gilles Marchand e Patrick Godeau, é baseado no livro homônimo de Sébastien
Japrisot. Japrisot, um conhecido escritor e diretor francês, foi responsável
por roteiros tão diversos como “A História de O” e “O Passageiro da
Chuva", grandes sucessos da década de 1970. O filme atual é um remake de
uma produção de mesmo nome de 1970, estrelada por Samantha Eggar e Oliver Reed.
O que chama a atenção em “Uma Dama
de Óculos Escuros Com uma Arma no Carro”, além da história curiosa, é a edição,
muito dinâmica, e que emprega o recurso de flashforward, entregando ao
espectador rápidas pistas sobre cenas que ainda estão por vir.
A recriação de época é excelente, e
traz um sentimento de saudosismo para quem viveu aqueles dias. Carros imensos e
beberrões, roupas curtas, óculos enormes, e notáveis costeletas, remetem a uma
época com problemas bem diferentes dos atuais. O filme ganhou a categoria de
Melhor Figurino no Prêmio Magritte 2016, na Bélgica.
Mas, o que desperta a atenção do
espectador é a dubiedade do que estamos vendo na telona. A personagem é
realmente inocente como acreditamos que seja? A construção da personagem lembra
um pouco a dualidade magnificamente criada por Jorge Amado em “A Morte e a
morte de Quincas Berro-Dágua”.
A credibilidade da personagem
central deve-se muito à linda atriz escocesa Freya Mavor, que fez aqui um de
seus primeiros filmes no cinema, tendo atuado bastante na televisão.
“Uma Dama de Óculos Escuros Com uma
Arma no Carro” é um filme interessante, que foge do convencional, e que
certamente irá agradar aos amantes do gênero suspense sem ter que escutar
infindáveis sequências de tiroteios.
Título
Original: “La dame dans l'auto avec des lunettes et un fusil”
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