Filmes da Semana: “Um Homem Chamado Ove” e “Terra de
Minas”
Já vão longe os tempos em que o cinema
sueco era reconhecido apenas pelos herméticos filmes de Ingmar Bergman. Nos
últimos anos, filmes e séries produzidos nos países escandinavos tem alcançado
um nível de excelência técnica e de conteúdo que ultrapassa mesmo a tradicional
indústria de Hollywood. Prova disso são dois excelentes filmes finalistas ao
Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2017, o sueco “Um Homem Chamado Ove” e o
dinamarquês “Terra de Minas”.
Apesar de terem temas bem
diferentes, os dois filmes escandinavos contém um aspecto em comum, que veremos
adiante. Obviamente, a qualidade técnica cinematográfica e cênica também são
excepcionais, mesmo com atores pouco conhecidos do grande público.
“Um Homem Chamado Ove” (“En Man
Som Heter Ove”, Suécia 2015) é baseado em um livro de mesmo nome, escrito por
Fredrik Backman. Na história somos apresentados ao personagem Ove (Rolf Lassgård),
um velho resmungão, irascível e extremamente metódico, que briga com qualquer
coisa que se mexa, principalmente com os vizinhos do condomínio em que mora.
Uma coisa que ninguém percebe é
que Ove já tentou o suicídio várias vezes, e sempre é atrapalhado por seus
novos vizinhos, a imigrante iraniana Parvaneh (Bahar Pars), que está grávida,
seu marido Patrick (Tobias Almborg) e as duas filhas do casal.
Enquanto a insistente Parvaneh
começa a quebrar a couraça de autoisolamento de Ove, o espectador toma
conhecimento da história dele, como a perda da mãe ainda na infância, e a
relação estreita com o pai, um homem de poucas palavras mas de valores
inabaláveis.
Além do pai, outra pessoa foi de
uma importância extraordinária na vida de Ove, a mulher Sonja (Ida Engvoll), o
grande amor de sua vida, a impulsionadora de seus sucessos e principal vítima
da tragédia que mudou a história do casal.
O filme “Terra de Minas” (“Under
Sandet”, Dinamarca 2015) traz como tema um assunto pouco conhecido, mas que é
considerado um crime de guerra tão grave quanto os cometidos pelos nazistas
durante a ocupação na Segunda Guerra Mundial.
Após o final da guerra na
Europa, em maio de 1945, as tropas alemãs na Dinamarca foram aprisionadas pelos
Aliados. Naquela altura do conflito, boa parte das tropas alemãs eram constituídas
por jovens, muitos deles ainda na adolescência, situação muito diferente das
tropas profissionais do início do conflito.
Parte desses jovens é obrigada a
treinar em desarmamento de minas, pois temendo um desembarque dos Aliados na
costa da Dinamarca, os alemães haviam instalado mais de dois milhões de minas
nas praias do país. Estima-se que dos dois mil prisioneiros submetidos a esta
tarefa, pelo menos a metade morreu ou ficou gravemente ferida.
Sem nunca ter trabalhado com
isso antes, sem comida ou equipamentos, um grupo de prisioneiros ficou sob o
comando do Sargento Rasmussen (Roland Moller), que os tratava com dureza e os
obrigava a trabalhar nas praias, desarmando e recolhendo os artefatos.
A convivência, as dificuldades,
os acidentes e mesmo os conflitos com os superiores faz com que Rasmussen aos
poucos mude a sua visão embrutecida pela guerra, e comece a enxergar nos
rapazes não somente os inimigos, mas seres humanos.
Curiosamente, este é o ponto em
comum entre estes filmes tão distintos. Enquanto Ove constrói uma máscara de
irascibilidade para esconder a própria dor, o Sargento Rasmussen e todos à sua
volta só enxergavam o inimigo nazista, mesmo naqueles jovens imberbes, que só
desejavam voltar para casa.
Em ambos, só a convivência, a
quebra de paradigmas, e a percepção da humanidade em si e no outro faz com os
personagens entendam que somos todos companheiros da mesma condição humana.
Independente da premiação, estes
dois filmes já valem o ingresso pela belíssima provocação que fazem,
principalmente na época em que vivemos, onde a intolerância alcança níveis
inimagináveis, e a cada dia mais e mais pessoas destilam o seu ódio contra
estereótipos de uma maneira totalmente irracional.
Títulos Originais: “En Man Som
Heter Ove” e “Under Sandet”