sexta-feira, 9 de julho de 2004

Claquete 09 de julho de 2004


Newton Ramalho - colunaclaquete@gmail.com


O que está em cartaz

As crianças invadem o cinema. Também, pudera, com as férias escolares, a programação está toda voltada para o lucrativo público infanto-juvenil. Além de “Homem-Aranha 2”, que bate até os records de bilheteria do seu antecessor, estréiam, nesta sexta-feria, mais três produções infantis. Maurício de Souza traz seus simpáticos personagens em “Cinegibi, o Filme – A Turma da Mônica”, enquanto a Disney contra-ataca com “Nem Que a Vaca Tussa”, último filme do estúdio produzido da maneira tradicional. Correndo por fora, chega também “Didi Quer Ser Criança”, com Renato Aragão. Continuam em cartaz, “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”, com as aventuras do bruxinho inglês, “Shrek 2”, com o simpático ogro verde, “Cazuza – O Tempo Não Pára”, cinebiografia autorizada de uma das maiores expressões da música brasileira pós-80, e, “Diários de Motocicleta”, sobre a vida pré-revolucionária de Che Guevara. Os dois últimos, só nas sessões a partir de 18h. Nesta semana, não acontecerá o Filme de Arte.


Turma da Mônica: “Cinegibi”

O mais conhecido criador de histórias em quadrinhos do Brasil, Maurício de Souza, lança mais um produto, “Cinegibi, o Filme – Turma da Mônica”. Com suas histórias divertidas, estreladas por Mônica, Cebolinha, Franjinha e seus amigos, “Cinegibi” continua uma tradição que completa quatro décadas. Desta vez, Franjinha decide ler gibis de uma forma diferente, com os quadrinhos em movimento. Para tanto, ele inventa um liquidificador gigante, que engole revistas em quadrinhos, e, as projeta na forma de filmes. Animados com a possibilidade de verem suas aventuras nos quadrinhos no cinema, os personagens da turma da Mônica convidam amigos da vida real e se preparam para a grande estréia. Além dos personagens, o filme conta também com a participação de Luciano Huck, Fernanda Lima, Wanessa Camargo, a dupla Pedro e Thiago, e, o próprio quadrinista Maurício de Sousa. “Cinegibi” estréia, nesta sexta-feira, no Cine 5 do Moviecom.


Nem Que a Vaca Tussa

Os Estúdios Disney lançam mais um desenho nos cinemas, com sabor de despedida. “Nem Que a Vaca Tussa” é o último filme em desenho tradicional, já que as próximas produções serão em computação gráfica. A fazenda Caminho do Paraíso está em pânico, pois uma ação de despejo ameaça acabar com o local. Temendo ir para o matadouro, os animais da fazenda decidem ajudar a dona a conseguir a quantia necessária para pagar a hipoteca. O alvo escolhido pelo grupo é o perigoso bandido Alameda Slim, que tem uma grande recompensa reservada para quem capturá-lo. Na dublagem brasileira, as vozes de Fernanda Montenegro, Cláudia Rodrigues e Isabela Garcia. Estréia nesta sexta-feira, no Cine 3 do Moviecom.

Didi Quer Ser Criança

Didi (Renato Aragão) trabalha como provador de balas em uma pequena fábrica de doces tradicionais. Eles estão sob a forte concorrência de uma outra fábrica, que produz doces usando corantes e ingredientes artificiais, que fazem mal às crianças. Além disso, a pequena fábrica, em que Didi trabalha, enfrenta a mídia da concorrência, que produz comerciais voltados para as crianças. Apesar de tentar convencê-las de que balas com ingredientes artificiais fazem mal, elas não ouvem Didi, já que criança não ouve adulto. À noite, Didi pede ajuda aos santos Cosme (Rafael de Castro) e Damião (Daniel de Castro), e, tem seu desejo atendido, na figura de dois homens maltrapilhos, a quem Didi ajuda. Eles dão a Didi um saco de balas mágicas, que têm o poder de transformar quem as come em criança. É a grande chance que Didi esperava para poder, enfim, convencer as crianças a rejeitar as balas artificiais, e, recuperar o espírito de Cosme e Damião. “Didi Quer Ser Criança” estréia nesta sexta-feira, no Cine 7 do Moviecom.



O Carteiro e o centenário do Poeta

Se estivesse vivo, Neftalí Ricardo Reyes Basoalto completaria 100 anos, no próximo dia 12 de julho. Antes de afirmar que não conhece ninguém com este nome, saiba que, assim foi batizado aquele que o mundo conheceria como Pablo Neruda. Dono de uma extensa obra, pela qual ganharia o prêmio Nobel de Literatura, Neruda foi diplomata e senador da república. Comunista, indispôs-se contra o governo de González Videla, sendo perseguido pelo regime. Chegou a ser candidato à presidência do Chile, mas renunciou em favor de Allende, que foi derrubado por Pinochet. Neruda morreu em 1973, doze dias depois da deposição de Allende. Um belíssimo filme, que tem Neruda como tema é “O Carteiro e o Poeta”, disponível em VHS e DVD. Por razões políticas, o poeta Pablo Neruda (Philippe Noiret) se exila em uma ilha na Itália. Lá, um desempregado (Massimo Troisi), quase analfabeto, é contratado como carteiro extra, encarregado de cuidar da correspondência do poeta, e, gradativamente, entre os dois se forma uma sólida amizade. Ganhou o Oscar de Melhor Trilha Sonora - Drama, além de ter sido indicado em outras quatro categorias. Numa coincidência trágica, o ator que fez o carteiro, Massimo Troisi, morreu um dia após o término das filmagens.



Adeus, Brando!

Esta coluna não poderia deixar de homenagear Marlon Brando, um dos mais talentosos atores de todos os tempos, que abandonou os palcos da vida, após 80 anos de uma relação de amor e ódio, com a Arte, e, com o mundo. Polêmico e rebelde, ganhou dois Oscars, e, foi indicado para outros seis. Outras tragédias marcaram sua vida. O filho mais velho, Christian, assassinou o namorado da irmã, Cheyenne, que suicidou-se em 95. Dizia-se que estava praticamente falido, ao morrer. Para rever alguns de seus melhores momentos, uma pequena lista: “Uma Rua Chamada Pecado”, “O Selvagem”, “Sindicato de Ladrões”, “A Casa de Chá do Luar de Agosto”, “Motim a Bordo”, “Queimada”, “O Chefão”, “O Último Tango em Paris”, e, “Apocalipse Now”, que teve uma versão ampliada, lançada recentemente, em DVD.


O Colar e a Revolução

Na próxima quarta-feira, dia 14 de julho, comemora-se a Revolução Francesa, comemorada no dia da queda da Bastilha. Muito falada, mas, pouco conhecida, a revolução germinou em meio às intrigas palacianas na corrupta corte do rei Luis XVI. Baseado em fatos verídicos, o filme “O Enigma do Colar”, de 2001, conta um pouco desta história. Jeanne de la Motte-Valois (Hilary Swank) perdeu título de nobreza, e, a casa da família, ainda muito criança. Casou-se, sem amor, com um nobre, apenas pelo título, após tentar, de todas as maneiras legais, reaver ser direito de nascimento. Quando nada mais dá certo, ela se alia ao amante e ao marido, em um intricado plano para roubar um colar precioso, e, comprar de volta o que é seu. Em meio a intrigas e romances, o escândalo desencadeia a derrocada da monarquia francesa. O DVD traz inúmeros extras, como Trailer de Cinema, Making Of, comentário do Diretor, Por Trás das Câmeras: O Enigma do Colar, e, Cenas Adicionais com Comentários.


O Nome da Rosa, em DVD

Antes que alguém diga que já tem este disco, saiba que está sendo lançada uma nova edição, com formato de tela widescreen e som DD 5.1, bem diferente da versão que chegou a ser vendida em bancas. A história, baseada no famoso romance de Umberto Eco, passa-se em 1327, quando o monge franciscano William de Baskerville (Sean Connery), e, Adso von Melk (Christian Slater), um noviço que o acompanha, chegam a um remoto mosteiro no norte da Itália. Baskerville e outros monges participam de um conclave, para decidir se a Igreja deve doar parte de suas riquezas, mas, a atenção é desviada por vários assassinatos, que acontecem no mosteiro. O monge começa a investigar o caso, que se mostra bastante intrincado, além dos demais religiosos acreditarem que se trata de obra do Demônio. William de Baskerville não partilha desta opinião, mas, antes que ele conclua as investigações, Bernardo Gui (F. Murray Abraham), o Grão-Inquisidor, chega no local, e, está pronto para torturar qualquer suspeito de heresia que tenha cometido assassinatos em nome do Diabo. O disco traz como extras os documentários “Uma Jornada Visual com Jean-Jacques Annaud”, e, “O Mosteiro do Crime”. Confira!

Filme recomendado: “Treze Dias Que Abalaram o Mundo”

Treze dias em Camelot


Já dizia Jorge Amado, em sua obra-prima “Os velhos marinheiros”, que a morte tem o poder de apagar pecados cometidos. Se a isso juntarmos as condições trágicas de um assassinato político, o quadro fica ainda mais completo. Por isso tudo é que, até hoje, é cuidadosamente cultivada a imagem de John Fitzgerald Kennedy, como o maior herói da história moderna da América. Centenas de livros e filmes ajudam a manter esta tradição, mas, aos poucos, vão se abrindo alguns clarões, que ajudam a revelar o lado mais obscuro de Camelot. Um destes é “Treze Dias Que Abalaram o Mundo”, que trata do episódio mais marcante do governo Kennedy.

Bem diverso do que o mito estabelece, Kennedy era um incorrigível mulherengo, extremamente ambicioso, que prosseguia o projeto do pai para dominar o poder na América. Junto com o irmão Bob ( Robert Kennedy, que também seria assassinado em 1968), conduzia a presidência como um meio de alcançar as suas metas pessoais. Os dois acreditavam que eram pessoas especiais, não sujeitas às regras que impunham aos demais pobres mortais.

A corrupção e o uso do Estado para fins pessoais era uma longa tradição na família de JFK desde os avós. O pai, Joseph Kennedy, chegou a ser embaixador na Inglaterra graças à amizade com o filho do então presidente Roosevelt. Terminou perdendo o cargo e a chance de concorrer à presidência, por conspirar contra o próprio chefe da nação.

Através de um projeto muito bem definido, John Kennedy iniciou sua carreira, rumo à presidência. O candidato natural era Joe, o filho mais velho, que desapareceu durante a Segunda Guerra. Usando todos os meios, legais e ilegais ao alcance, JFK passou pelo senado, e, finalmente, chegou ao cargo máximo do executivo americano. Para chegar lá, utilizou os serviços de um velho amigo da família, Sam Giancana, mafioso de Chicago. Depois das eleições, muitas acusações de fraude eleitoral em Illinois chegaram ao Departamento de Justiça - que era chefiado por Bob Kennedy. Nenhuma das acusações chegou a ser investigada, obviamente.

As relações de Kennedy com o gângster Giancana incluíram planos para o assassinato de Fidel Castro e uma amante comum, Judith Exner. Segundo a própria, bolsas cheias de dinheiros eram enviadas através dela do presidente para o mafioso ou de empresários californianos para JFK.

Todas as atividades da família Kennedy eram acompanhadas, desde a década de quarenta, por Edgar Hoover, diretor do FBI. Por acreditar que a instituição da presidência era mais importante que o homem que a ocupava, Hoover não impediu que Kennedy se elegesse. Em compensação, a sua recondução como diretor do birô foi um dos primeiros atos do jovem presidente.

Assim como Hoover, o Serviço Secreto também acreditava que tinha que preservar a imagem do presidente - coisa que ele próprio não se preocupava. Algumas vezes, os agentes que guardavam o presidente tinham que fazer milagres, para impedir que a primeira-dama Jackie entrasse na área de lazer da Casa Branca, onde John e Bob faziam divertidas festas, com prostitutas de todos os níveis.

A crise dos mísseis de Cuba foi o grande evento do governo Kennedy. A pequena ilha do Caribe estava atravessada na garganta de JFK, desde abril de 1961. Nessa data, uma brigada de 1400 refugiados cubanos, apoiados pela CIA, desembarcou na Baía dos Porcos, para tentar derrubar Fidel Castro. A desorganização do golpe, aliado à retirada de apoio aéreo - ordenada pelo próprio JFK - resultou na morte de 112 invasores, e, na prisão do restante. Foi um desastre completo.

Em meio a planos mirabolantes, para assassinar o líder cubano, os americanos descobriram, através dos vôos do avião de espionagem U-2, que bases para lançamento de mísseis balísticos estavam sendo montados em Cuba. Os treze dias, que deram o título ao filme, foi o período estimado entre a descoberta e a data em que ficariam prontos para serem usados. Pela versão oficial, Kennedy impôs um bloqueio naval em Cuba e forçou os russos a retirarem os mísseis. Aplausos homéricos.

A história por baixo do pano é um pouco diferente. Mesmo numa época de corrida armamentista, o poderio militar soviético era muito inferior ao americano. Para se ter uma idéia, enquanto os Estados Unidos tinham trezentos lançadores de mísseis, os russos teriam no máximo quarenta e quatro - já contando com os de Cuba.

No seu ódio irracional para com os cubanos, Kennedy bravateava numa posição de valentão, enquanto corria desesperadamente junto com o irmão Bob para uma solução negociada. Para isso, utilizaram até os serviços de um agente da KGB, passando por cima dos canais diplomáticos formais.

Ninguém queria uma guerra nuclear, mas, acima de tudo, Kennedy queria a reeleição. Por isso, mesmo tendo feito um acordo com Khrushchev, o líder da União Soviética, manteve a propaganda de valentão do mundo. Pelo acordo, os mísseis soviéticos seriam retirados de Cuba em troca de mísseis americanos na Turquia, e - o mais importante - a garantia de que a ilha de Fidel jamais sofreria uma invasão dos Estados Unidos. Os cubanos foram os grandes vencedores da crise dos mísseis.

Para o mundo, o que se via era a véspera de um holocausto nuclear. A frota do Comando Aéreo Estratégico, com mais de 1400 bombardeiros B-52 e B-47, além de 174 mísseis balísticos intercontinentais, entrou em DEFCON 2, que é o último estágio antes da guerra total. Um oitavo de todos os bombardeiros ficou no ar, durante trinta dias. Mais de cem mil homens foram posicionados na Costa Leste, enquanto que uma força naval com quarenta mil fuzileiros navegava no Caribe e Atlântico Sul. Enquanto isso, do lado soviético, não havia nenhuma atividade que não fosse de rotina.

Como os Kennedy pretendiam se manter pelo menos mais dez anos no poder (com uma reeleição de John, e, depois, a dobradinha Bob-John), é possível que os soviéticos tenham preferido deixar os americanos saboreando uma vitória falsa, ficando com informações que, praticamente, manteriam os Kennedy em suas mãos. Só a morte de John desfez tanto as ambições dos Kennedy como a possível ameaça russa.

O filme “Treze Dias Que Abalaram o Mundo” toca em vários desses pontos delicados, inclusive nas negociatas conduzidas pelos irmãos, mas, evita mostrar o lado mais pessoal de JFK. A história é mostrada pelo ponto de vista do principal assessor de Kennedy, Kenneth O' Donnell, sobre quem pesaram acusações de desvio de dinheiro da campanha de 1964, para uso próprio. Quem vive o papel é Kevin Costner, que já estrelou um outro filme sobre Kennedy, “JFK - A Pergunta Que Não Quer Calar” onde interpretava o promotor que investigou a morte do presidente. É uma pena que Bruce Greenwood, ator escolhido para o papel de Kennedy, não fosse mais parecido com o próprio. Afinal de contas, é incontestável o charme e o magnetismo pessoal do verdadeiro JFK.

Lamentável mesmo é o descaso que foi dedicado à edição latina em DVD, da Europa Filmes. O formato de tela é Full Screen, o áudio oferece as opções inglês ( 5.1 e 2.0) e português 2.0. Como extras, um making of, legendado em espanhol (!) de treze minutos, que nada mais é do que cenas de bastidores, algumas entrevistas com os atores, trailer e biografias do elenco. Teria sido fantástico se tivesse sido acrescentado alguma coisa a mais sobre os fatos históricos reais.

Apesar de não ter ido mais a fundo na personalidade de JFK, o filme “Treze Dias Que Abalaram o Mundo” é um exercício muito bem feito de cinema. Nele há uma mistura de filme de ação, relato histórico, drama político e reconstituição de época. Afinal de contas, não existe uma verdade absoluta, é preciso que formemos a nossa própria crença a partir do máximo de informações disponíveis. Este filme é uma fonte delas.

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