A primeira vez que ouvi mencionar o
título “Bagdad Café” (“Out of Rosenheim”, 1987) foi por um tio muito querido,
que era cinéfilo de carteirinha. Como o gosto dele era extremamente refinado,
já senti que este filme teria algo de excepcional, e minha expectativa foi
confirmada ao assistir o que considero ser um dos melhores exemplares da
história do cinema.
Para os que estão acostumados a ver
personagens lindos, com cara de propaganda de margarina, os primeiros momentos
do filme serão assustadores. As protagonistas são uma alemã gorda e uma
americana negra e desgrenhada. Os demais personagens não fogem do padrão, e
tudo parece até coisa do mundo real!
Apesar do filme não dar muita
explicação, deduz-se que um casal alemão viajava em férias pelos Estados
Unidos, e perdeu-se em meio às estradas do Arizona enquanto buscava algum ponto
turístico. Pelos motivos que só ela saberia dizer, Jasmin Münchgstettner
(Marianne Sägebrecht) sai do carro, pega a mala e sai andando pela margem da
estrada, com seu chapéu bávaro e um elegante terninho, debaixo do causticante
sol do deserto.
Perto dali, Brenda (CCH Pounder)
perdia as estribeiras com o marido enquanto lidava com os filhos, um neto ainda
bebê, e um decadente motel de beira de estrada como tantos outros nos Estados
Unidos. A discussão termina com a separação abrupta, praticamente ela
expulsando o marido de casa.
O encontro destas duas mulheres
acontece quando Jasmin procura um quarto para dormir. A chegada da alemã
provoca imediata desconfiança em Brenda, que aluga o quarto, mas acha estranho
que a recém-chegada só tenha roupas de homem. Na verdade, na discussão, Jasmin
pegara a mala do marido, por engano.
Extremamente metódica, fanática por
limpeza, e com uma imensa vontade de ajudar os outros, Jasmin aproveita uma
ausência de Brenda para fazer uma grande faxina no motel, tirando até a poeira
do telhado. Isso enfurece Brenda, que considera ser uma invasão direta na sua
vida.
Aos poucos, porém, Jasmin começa a
se tornar parte da vida dos estranhos habitantes do lugar: Phillys (Monica
Calhoun), uma adolescente da pá-virada, mais preocupada em baladas que nos
estudos, Salomo (Darron Flagg), para quem só a música existia, Cahuenga (George
Aguilar), o funcionário indígena que fazia tudo, Debby (Christine Kaufmann), a
tatuadora que fazia sucesso com os caminhoneiros, e o exótico Rudi Cox (Jack
Palance), o pintor hiponga que morava num trailer ao lado do motel.
Neste cenário desértico,
aparentemente distópico e pós-apocalíptico, todos parecem estranhos e perdidos,
cada um com seus problemas, vivendo uma vida sem sentido. Neste contexto,
Jasmin parece ser a peça que faltava para uni-los, e dar um novo rumo em suas
vidas.
Além de uma história interessante,
muito bem apresentada em um roteiro perfeito, “Bagdad Café” tem uma fotografia
exuberante, que explora a desolação do deserto (e da vida dos personagens), uma
edição inovadora para a época, e uma belíssima trilha sonora, com variações da
música “Calling You”, indicada para Melhor Canção no Oscar de 1989. Todas as
canções do filme foram compostas pelo músico Bob Telson.
“Bagdad Café” marcou a estreia do
diretor alemão Percy Adlon no mercado americano. Foi dele a escolha de Marianne
Sägebrecht para o papel de Jasmin. Marianne já era na época do filme uma das
atrizes mais respeitadas da Alemanha, com grande participação na cena cultural
alemã, em especial em Munique, sua cidade. Uma de suas frases favoritas é que “nós,
os bávaros, somos para a Alemanha o que os índios são para os Estados Unidos”.
O filme foi lançado em 1987, e quem
não teve a sorte de assisti-lo na tela grande sofreu um pouco com a baixa
qualidade de imagem oferecida pelos videocassetes, na época a única de ver
filmes em casa, além da televisão.
O lançamento do filme em Blu-Ray
permite resgatar tanto a beleza da imagem quanto do som, dois aspectos
fundamentais que garantiram o sucesso da obra por muito tempo. Para os amantes
do bom cinema, esta é uma obra imperdível.
Título Original: “Out of Rosenheim”
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