Newton Ramalho
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Filme da Semana: “Raça”
Um filme que tem tudo a ver com o momento que vivemos
é “Raça”, dirigido por Stephen Hopkins, e que mostra o período mais importante
da vida de Jesse Owens, o atleta negro que estragou a tão desejada consagração
ariana de Hitler, na Olimpíada de 1936.
Obviamente, a semelhança com o momento atual deveria
ser a época da Olimpíada do Rio, oitenta anos após os feitos de Owens na
Alemanha nazista. Porém, o que o filme mostra é o jogo cruel dos preconceitos,
e principalmente a intolerância intransigente, que infelizmente está cada vez
mais presente nos dias atuais.
O filme inicia com o momento em que Owens (Stephan
James) vai para a universidade de Ohio, onde será treinado por Larry Snyder
(Jason Sudiskis), burilando o potencial que tinha como corredor de curta
distância.
A história é mostrada alternando entre a visão de
Owens, suas dificuldades pessoais e profissionais, e a luta de Avery Brundage
(Jeremy Irons) contra Jeremiah Mahoney (William Hurt) e muitos americanos que
queriam que os Estados Unidos boicotassem as Olimpíadas na Alemanha pela forma
como judeus, ciganos e outras minorias estavam sendo tratados.
Como ainda é comum nos dias de hoje, o puro e
romântico espírito olímpico era o que menos importava. Se por um lado a
Alemanha queria usar os jogos como propaganda de sua superioridade, havia
interesses conflitantes nos Estados Unidos, onde não só a política, mas até a
forma como os negros eram tratados deixavam os atletas confusos.
A emoção dos eventos olímpicos é bem retratada,
embora a realidade talvez tenha sido até mais vibrante. É possível que haja
alguma distorção causada pela propaganda antinazista na rejeição aos negros por
Hitler. Afinal de contas, deveriam existir pouquíssimos negros na Alemanha
daquela época, e a intolerância dos nazistas tinha endereço certo, que era a
população judaica.
Na verdade, o preconceito maior que Jesse Owens
sofreu foi da própria comunidade americana, que nunca valorizou os seus feitos.
Ao contrário do que mostra o filme, Hitler até acenou para Owens da tribuna de
honra. Em compensação, ele nunca recebeu nenhum reconhecimento por parte das
autoridades americanas – nem um telegrama, segundo palavras do próprio Owens.
Uma figura notável naquela ocasião foi o atleta
alemão Carl “Luz” Long (David Cross). Ele tornou-se parte das lendas olímpicas pela
medalha de prata do salto em distância em Berlim, 1936, e por ter dado
conselhos a Owens que salvaram a participação deste na competição. Ele morreu na
Segunda Guerra, e foi homenageado postumamente com a medalha Pierre de
Coubertin, a mais alta honraria concedida pelo Comitê Olímpico Internacional.
Outra personagem importantíssima recebeu uma justa
homenagem neste filme, a alemã Leni Riefenstahl (Carice Van Houten), a genial “cineasta
de Hitler”, que produziu filmes fantásticos, mas que tinham como tema a
exaltação do regime nazista. Por conta disso, após a guerra, depois de passar
quatro anos em um campo de prisioneiros, foi boicotada pela indústria,
dedicando-se à fotografia. Apesar das críticas – verdadeiras ou falsas – Leni Riefestahl
foi uma das mais revolucionárias profissionais do cinema.
Com mais de duas horas de duração, “Raça” traz para
as novas gerações os feitos extraordinários de um homem simples, que teve que
lutar contra todos para mostrar o seu talento – e principalmente contra os seus
compatriotas.
Uma curiosidade sobre o título original, “Race”, é
que, em inglês a palavra tanto pode significar “corrida” como “raça”. Em
português nós também temos um duplo sentido para “raça”, que tanto pode
significar a origem genética quanto a bravura ou valor de alguém.
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