sexta-feira, 28 de janeiro de 2005

Claquete 28 de janeiro de 2005



Newton Ramalho - colunaclaquete@gmail.com

O que está em cartaz

Depois de uma semana com várias estréias, o final de semana chegou meio morno, apenas com o besteirol “Entrando Numa Fria Ainda Maior”, que tem, como maior mérito, reunir Robert de Niro, Dustin Hoffman, e, Barbra Streisand, na mesma tela. Mas, tem muita coisa boa em cartaz, do infantil ao terror explícito. Nas continuações, o mais badalado é mesmo o polêmico “Alexandre”, de Oliver Stone, com direito a muitas batalhas e beijos. Para os “altinhos”, tem o filme de ação “Elektra”, com Jennifer Garner, revivendo o seu personagem de “Demolidor”, o remake “A Volta ao Mundo em 80 Dias”, como o acrobático Jackie Chan, “Doze Homens e Outro Segredo”, com George Clooney e sua turma, o suspense “O Grito”, remake de um famoso filme japonês, e, o drama “Perto Demais”, com Julia Roberts, e, Natalie Portman, que confirma o seu talento dramático. Para os baixinhos, além de “Desventuras em Série”, com o camaleônico Jim Carrey, que sofreu algumas flutuações na censura, tem o divertido “A Lenda do Tesouro Perdido”, com Nicolas Cage, e, grande elenco, numa aventura no estilo Indiana Jones, a maravilhosa animação “Os Incríveis”, parceria da Disney com a Pixar, campeão de audiência nos cinemas americanos, o desenho animado “Bob Esponja”, da Nickelodeon, e, as produções nacionais “Tainá 2 – A Aventura Continua”, “Eliana em O Segredo dos Golfinhos”, com a apresentadora infantil Eliana, e, “Xuxa e o Tesouro da Cidade Perdida”. Em pré-estréia, o filme de terror “Jogos Mortais”.


Pré-Estréia: “Jogos Mortais”

Para os fãs de filmes de terror, chega “Jogos Mortais”. Leigh Whannell (que também assina o roteiro) é Adam, que, junto ao Dr. Gordon (Cary Elwes), está ligado a um assassino em série. Eles acordam, em uma cama, sem saber como chegaram lá. Entre eles, o cadáver de um terceiro homem, que fora assassinado. Os dois são a chave para a descoberta da identidade de um assassino sádico. O filme, que teve sua estréia no Festival de Sundance, foi produzido pela independente Evolution Management. Completando o elenco, Danny Glover (Tapp), Ken Leung (Sing), Monica Potter (Diana) e, Tobin Bell (John). A direção é de James Wan. “Jogos Mortais” tem pré-estréia, nesta sexta-feira, e, sábado, no Cine 2 do Moviecom, na sessão de 21h40.



Estréia: “Entrando Numa Fria Maior Ainda”

Em 2000, o filme “Entrando Numa Fria” contava a história de Greg Focker (Ben Stiller), um atrapalhado noivo, que mete-se nas maiores confusões, ao passar um simples final de semana na casa dos futuros sogros. Pelo jeito, a história agradou, pois Greg e Jack Byrnes (Robert De Niro) estão de volta, e, aparentemente, se dando muito bem. Greg e Pam (Teri Polo) estão animados, com os preparativos do casamento, mas, há ainda uma pendência a ser resolvida: os futuros sogros precisam passar um fim de semana juntos. Para resolver o problema Greg, Pam, Jack e Dina (Blythe Danner) viajam, no moderno trailer de Jack, rumo à ilha Focker, em Cocoanut Grove. Ao chegar, os Byrnes conhecem Bernie (Dustin Hoffman), e, Roz (Barbra Streisand), pais de Greg. Porém, o modo liberal como os Fockers levam a vida, entra em conflito com os rígidos valores pregados por Jack. Rara oportunidade de ver tantos talentos da velha guarda juntos, embora seja mais recomendado aos amantes do gênero besteirol. Com direção de Jay Roach, “Entrando Numa Fria Ainda Maior” estréia, nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, no Cine 6 do Moviecom. Para maiores de 12 anos.


Adeus, VHS

Se você ainda tinha alguma dúvida, sobre comprar, ou não, um aparelho de DVD, saiba que o disquinho já domina o mercado. Se, em 1998, alcançava meros 4% do mercado, em 2001 já ultrapassava, em vendas, o VHS, e, em 2004, já significa 88% de um mercado de mais de 20 milhões de cópias. Isso já está forçando as locadoras a reverem as suas estratégias. O braço brasileiro da poderosa rede Blockbuster já anunciou que não compra mais filmes em VHS, e, as distribuidoras de filmes já planejam sair do ramo de fitas de vídeo em 2007.



DVDs coreanos

Está cansado de esperar séculos, pelo seu filme favorito, que já saiu lá fora, e, no Brasil, as distribuidoras nem dão bola? Pois saiba que existe uma boa alternativa, além do mercado americano. É a Coréia, que oferece, a preços atrativos, DVDs de boa qualidade, alguns, inclusive, com legendas em português (de Portugal, provavelmente). O filme “Herói”, quem nem estreou em nossos cinemas, pode ser comprado por oito dólares, lá. Acautele-se, porém, quanto ao sistema de cor, que deve ser NTSC, comum em nossos televisores e DVD players, e, quanto à possibilidade do filme ter sofrido algum corte, devido à rigidez da censura de lá. Se quiser experimentar, visite www.koreandvds.com.



Paul Newman: 80 anos

O ator Paulo Newman, que atuou em alguns dos mais marcantes filmes de Hollywood, completou 80 anos de idade, no último dia 26. Newman, que continua em plena atividade, já foi indicado para nove Oscars, ganhando, como Melhor Ator, em “O Indomável”, de 1986. Ganhou, ainda, dois Oscars especiais, concedidos pela Academia: um em 1985, em reconhecimento ao seu trabalho junto ao cinema, e, outro, em 1993, por sua atuação junto a causas humanitárias. Para conferir a longa carreira de Newman, experimentem “Butch Cassidy”, “Golpe de Mestre”, “Inferno na Torre”, “O Veredicto”, “A Cor do Dinheiro”, “Uma Carta de Amor”, e, “Estrada Para a Perdição”, que lhe rendeu a última indicação ao Oscar. Todos estes filmes já estão disponíveis em DVD.


Os que morreram na praia do Oscar

Sempre nos desapontamos, quando um filme brasileiro nem aparece, entre os cinco finalistas, como foi o caso de “Olga”, nesta edição do Oscar. Contudo, imaginem a decepção de diretores famosíssimos, como Alfred Hitchcock, que apesar de ter concorrido para cinco Oscars de direção, incluindo o magnífico “Psicose”, nunca recebeu nenhum. Martin Scorsese, indicado este ano por “O Aviador”, pode igualar este triste recorde, ou, receber a sua primeira estatueta. “O Aviador” foi indicado para onze categorias, incluindo a de Melhor Filme, e, Melhor Ator, com Leonardo DiCaprio.


“Desventuras em Série”: Censura para lá e para cá


Um fato curioso ocorreu com o filme “Desventuras em Série”, que estreou na última sexta-feira. Originalmente com censura livre, o filme teve esta indicação alterada para maiores de 12 anos, durante a semana. A partir de ontem, dia 27, o filme passou a ter a classificação para maiores de 10 anos, graças a um recurso da distribuidora UIP, pedindo que a decisão anterior fosse reavaliada. Na opinião desta coluna, o filme poderia até mesmo ter a censura liberada, para crianças menores, pois não há cenas de violência, ou, algum tema mais agressivo.


Filme recomendado: “Calígula”

Limite da ousadia ou ousadia sem limites?

Quem faz cinema sempre fica dividido entre aquilo que quer mostrar, e, o que deve – ou pode – ser mostrado. Se, por um lado, existe o interesse comercial em explorar a curiosidade do espectador, por outro lado, há sempre a preocupação em ofender grupos mais conservadores. Esses grupos, mais reacionários, reagem, às vezes, fortemente, ante a exibição de violência, sexo, e, agressão a valores morais e religiosos. Não poderia ser diferente então a reação provocada pelo filme “Calígula”, que não apenas explorou os temas acima citados como ainda apresentou impensáveis cenas de sexo explícito. Se alguns beijos e diálogos em apologia a homossexualismo causaram impacto no recente “Alexandre”, imaginem o que este filme de Tinto Brass provocou, vinte e cinco anos atrás, sendo mundialmente rotulado de imoral, e, ultrajante.

Mas, como retratar, com fidelidade, uma época luxuriosa, onde um déspota, insano e sádico, de vinte e cinco anos, dominava metade do mundo, com poder absoluto, de vida e morte, sobre qualquer ser vivo? Orgias, execuções, torturas, e, extremas desigualdades sociais faziam parte do dia a dia da Roma Antiga. É possível que a realidade, naqueles dias, fosse muito mais chocante, para os nossos olhos, do que a versão produzida por Bob Guccione.

Se o filme é estranho, polêmico, e, perturbador, o homem retratado, e, sua época, o eram mais ainda. Quem era, afinal, este ser tão horrendo, que legou o seu nome como sinônimo de crueldade, e, devassidão? Todos os cronistas concordam que, Calígula (12 – 41 dC) possuía elementos de loucura, crueldade, vícios, extravagância, e, megalomania. O jovem imperador era alto, magro, pálido, e, prematuramente calvo. Do imperador Augusto herdou a ambição, e, a sensualidade, bem como a epilepsia, que acompanhou a família. Ele costumava fazer caretas (gostava de praticar na frente de um espelho), e, era um orador impressionante. Sua verdadeira natureza era cuidadosamente oculta, a ponto de seu tio-avô e imperador, Tiberius, ter dito, certa vez: “Nunca existiu um escravo melhor, e, um senhor pior do que Calígula”.

Criança ainda, Gaius Caesar era levado pelo pai, Germanicus, para as campanhas militares contra os bárbaros. Mascote das tropas, ele ganhou o nome, pelo qual entrou para a História, por conta das botas militares que usava (caligula significa botinhas). Mais tarde, viu o pai, a mãe, e, os irmãos, serem executados, por ordem de Tiberius, e, seu ambicioso comandante da Guarda Pretoriana, Sejano.

A adolescência de Calígula foi passada, virtualmente, como prisioneiro de Tiberius, na ilha de Capri, onde o imperador construiu uma fortaleza inexpugnável, para proteger-se das conspirações e assassinatos freqüentes na corte. De acordo com os historiadores Tacitus e Suetonius, lá, Tiberius dedicava-se a refinadas sessões de torturas, e, perversidades sexuais. Foi assim que, em 37 dC, Tiberius adoeceu, e, entrou em coma. Dizem as más línguas que, enquanto Calígula recebia as felicitações como novo imperador, Tibérius despertou, sendo “convencido” a morrer com a ajuda de Macro, que seria o novo chefe da guarda imperial.

Os primeiros meses do império de Calígula foram tranqüilos, com a proclamação de uma anistia geral, e, muitos jogos no Coliseu. Uma das primeiras medidas do novo governante foi acabar com os julgamentos, e, execuções, por traição, que tinham sido comuns, nos últimos anos do governo anterior. Mesmo assim, era um freqüentador assíduo das punições, e, execuções legais, principalmente quando fossem prolongadas.

Poucos meses depois, morreu sua avó Antonia, uma das duas pessoas que exerciam boa influência junto ao jovem imperador. Nesse mesmo ano, Calígula caiu seriamente doente, do que se imagina ter sido encefalite. Quando se recuperou, parece ter mudado, para muito pior do que era. Em poucos meses, exauriu o Tesouro, que Tiberius levara anos para amealhar. Obrigou Macro a suicidar-se, e, mandou assassinar Gemellus, neto e herdeiro de Tiberius. Em uma ocasião em que havia poucos condenados para lutar contra os tigres e leões, no Coliseu, ordenou que vários espectadores fossem arrastados, de seus lugares, para a arena.

Calígula tinha uma sensualidade exacerbada, chegando a praticar incesto com as três irmãs. Ele escolhia quem quisesse, usava-a a seu bel-prazer, e, descartava a moça (ou rapaz) sem o menor constrangimento. Sua primeira mulher, Julia Claudilla morreu muito jovem. Ao comparecer a um casamento, raptou a noiva, Lívia Orestilla, divorciando-se dela, depois de poucos dias. O mesmo ocorreu com Lollia Paulina, a terceira esposa. Casou-se, então, com Milonia Caesonia, na época, grávida, de pai desconhecido. A sensual (e vulgar) Caesonia era o par perfeito para Calígula. Quando nasceu Julia Drusilla, Calígula reconheceu-a como sua filha e herdeira.

Enquanto progredia sua vida familiar, Calígula mantinha o seu padrão de sensualidade desenfreada, mantendo relações com homens, mulheres, e, obrigando até mesmo sua irmã favorita, Drusilla, a viver como sua esposa. Numa trágica seqüência, logo Drusilla morreu, indo com ela o que restava de influência benéfica sobre Calígula.

O imperador continuou, alucinadamente, a cometer abusos, como promover um bordel na corte, usando, como prostitutas, as mulheres e filhas dos senadores. Levava o cavalo Incitatus para o Senado, ricamente ajaezado, com pedras preciosas, embora não existam provas de que foi eleito senador, como se fala. Após promover uma caríssima campanha para invadir a Bretanha, ordenou que os exércitos voltassem abruptamente, trazendo conchas marinhas, para serem expostas como troféus de batalha.

Finalmente, em 21 de janeiro de 41, Calígula foi assassinado por soldados da sua própria Guarda Pretoriana, juntamente com a mulher, a filha, e, todos os membros da família que foram encontrados no palácio. Horas depois, a Guarda chegou à conclusão de que, se não houvesse um imperador, não haveria necessidade de uma guarda imperial. Procurando por sobreviventes à sua própria matança, os soldados encontraram o gordo, e, aterrorizado Claudius, tio de Calígula, escondido nas cortinas de um salão. Proclamado imperador, o patético Cláudius surpreendeu, e, mostrou-se um ótimo governante. Mas, essa parte pertence aos livros de História.

O filme de Guccione foi bastante fiel à História, embora essa fidelidade tenha chocado a muitos. Todos os principais fatos relatados pelos historiadores da época estão presentes no filme, embora a ambientação e detalhes ficassem por conta do estúdio. Do que mais se fala são das cenas de sexo explícito, que, na verdade, não envolvem nenhum dos principais atores, e, foram enxertadas depois da filmagem principal concluída. Para isso Guccione trouxe uma dúzia de garotas da Penthouse (“Pets”), e, rodou as seqüências mais explícitas, como o bacanal do bordel imperial, e, uma antológica cena de lesbianismo, entre Anneka di Lorenzo e Lori Wagner.

Independente do conteúdo, tudo que envolve o filme impressiona. O roteiro original é assinado por nada menos que Gore Vidal, renomado novelista, roteirista, ensaísta, teatrólogo, e, historiador. O criador de cenários e roupas foi Danilo Donati, quatro vezes ganhador do Oscar, e, colaborador assíduo de Fellini. Grandes atores participaram do filme, como Peter O`Toole (“Lawrence da Arábia”) e Malcon MacDowell, recém saído do polêmico “Laranja Mecânica” de Kubrick. A produção consumiu 17.5 milhões de dólares, que significam pelo menos três vezes mais, quando corrigidos para valores atuais.

O filme, iniciado em 1976, só chegou ao grande público em 1980. Por conta da repercussão sobre o conteúdo “pornográfico”, existem várias edições, fazendo a duração do filme variar de 143 a 156 minutos. A classificação também variou muito: enquanto que, na Austrália, foi considerado pornográfico, na maioria dos países foi censurado para menores de dezoito anos. Já França, e, Dinamarca, limitaram em dezesseis anos, e, Suécia, em quinze. Será que essas barreiras não fizeram só aguçar a curiosidade dos adolescentes?

O DVD, lançado no Brasil na edição comemorativa dos vinte anos do filme, permitiu que tivéssemos acesso não só à versão não censurada no formato original de cinema, como também a um excelente documentário, de uma hora de duração, totalmente legendado em português. O som oferece as opções Dolby Digital 5.1 e 2.0, ambas em inglês.

Talvez permaneça a dúvida inicial de quem nunca viu o filme: vale à pena assisti-lo? Essa é uma pergunta difícil de responder, porque é absolutamente individual. Por uma questão ética, creio que deva ser respeitada a limitação de idade para o Brasil, só sendo permitido o acesso aos maiores de dezoito anos. Embora as televisões abertas apresentem programas até mais fortes que “Calígula”, creio que a legislação, por princípio, deva ser respeitada. Se, mesmo adulto, o espectador tem restrições a cenas de nudez, sexo, e, violência, também não aconselho que veja o filme. O mesmo conselho vale para quem tenha uma formação mais conservadora, tanto moral quanto religiosa.

Quem, afinal, o espectador para Calígula? Se a pessoa é mais receptiva a visões diferentes, de um tema histórico, e, não pertence ao grupo do “não vi e não gostei”. Pode ser assistido, até mesmo, para proporcionar elementos para condena-lo. Se conseguirmos nos afastar dos preconceitos, e, paradigmas, teremos a chance de olhar para uma época, que pertence ao nosso passado, e, às nossas raízes culturais. Faça a sua escolha.

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