sexta-feira, 14 de maio de 2004

Claquete 14 de maio de 2004


Newton Ramalho - colunaclaquete@gmail.com


O que está em cartaz

Natal está sendo invadida! Mas, é uma invasão que deverá agradar gregos e troianos: a superprodução “Tróia”, estrelada por Brad Pitt e Eric Bana, chega arrasando, estreando em quatro salas, de uma vez. O filme ressuscita os épicos que fizeram a festa nos anos 60. Continuam em cartaz: “Van Helsing – O Caçador de Monstros”, colcha de retalhos de histórias de monstros, juntando vampiros, lobisomens, zumbis, e, muitos atores canastrões, o infanto-juvenil “Scooby-Doo 2 – Monstros à Solta”, com Salsicha e sua gangue, a aventura nos desertos africanos, “Mar de Fogo”, com Viggo Mortensen e Omar Shariff, o policial “Roubando Vidas”, com Angelina Jolie, e, o drama nacional “Benjamim”, com Paulo José e Cléo Pires. No Filme de Arte do Cine Natal 1, “Amen”.


Tróia

Para quem estava preocupado se “Tróia” seria só pano de fundo para exibição do corpo malhado de Brad Pitt, pode ficar tranqüilo. “Tróia” retoma uma tradição hollywoodiana de superproduções baseadas em épicos, levadas às telas, no passado, com títulos como “Ben-Hur” e “Spartacus”. Fugindo dos efeitos especiais gratuitos, o diretor Wolfgang Petersen trouxe uma história humana, esquecendo as alegorias divinas, tão presentes na Mitologia Greco-Romana. Por outro lado, as batalhas são um espetáculo à parte, que vão fazer a festa dos amantes dos filmes de ação. A história, esta é bem conhecida, mas o que interessa é a maneira de conta-la. A confusão começa quando Páris, filho do rei Príamo (o fantástico Peter O´Toole), de Tróia, rapta Helena (a novata Diane Kruger), a bela esposa de Menelau, rei de Esparta. Para se vingar, Menelau forma um poderoso exército, comandado por Agamenon (Brian Cox), e, no qual se destacam Aquiles (Brad Pitt) e Ulisses (Sean Bean), do lado dos gregos, e, Heitor (Eric Bana), do lado dos troianos. O cerco de Tróia, que durou dez anos, foi marcado por feitos heróicos de ambos os lados, até que, sob inspiração de Ulisses, os gregos construíram um gigantesco cavalo de madeira, e, o abandonaram perto das portas de Tróia, fingindo uma retirada. Apesar dos presságios de Cassandra, os troianos levaram para dentro da cidade o gigantesco cavalo, que trazia em seu interior os guerreiros de Ulisses. Abertas as portas, os gregos saquearam e destruíram Tróia. Estréia nesta sexta-feira, no Cine Natal 2, e, nas Salas 3, 6, e, 7, do Moviecom, censurado para menores de 14 anos.


Tamanho (da TV) é documento?


A resposta para esta pergunta, depende do seu bolso, e, do tamanho da sua sala. Com o advento do DVD, a imagem grande apaixona e atrai muita gente. O problema é que, se a tela ficar muito próxima do sofá, há o risco de desconforto visual durante as sessões de filmes. Uma regra prática, é que, a altura da tela, deve ser a distância ao sofá, dividida por cinco. Assim, a tela de 29 polegadas atende uma distância de dois metros, a de 34, dois metros e meio, a de 38, três metros, e, assim por diante. Contudo, o tamanho não deve ser o único parâmetro. Nesta altura do campeonato, não compre uma tela que não seja superplana, pois os seus olhos irão agradecer. Além disso, outros itens, como entradas vídeo componente e S-VHS, e, compressão de imagem, pesam muito na real utilização da TV como monitor para os seus filmes em DVD. Em tempo: fuja das widescreen, pelo menos, até a chegada da TV Digital, que ainda deve demorar. Escolha sua TV com cuidado, pois é um investimento relativamente alto, e, que não se faz com freqüência. Boas compras!


Durval Discos, em DVD

Quem não tem cão, caça com boas idéias. Longe dos efeitos especiais milionários de Hollywood, filmes como “Durval Discos” agradam, pela boa produção, além de um roteiro inteligente. Grande vencedor do Festival de Gramado de 2002, “Durval Discos” chega agora, ao grande público, em DVD. Durval (Ary França), e, sua mãe, Carmita (Etty Fraser), vivem, há muitos anos, na mesma casa onde funciona a loja Durval Discos. Muito conhecida no passado, a loja hoje vive uma fase de decadência, devido à decisão de Durval de não vender CDs, e, manter-se fiel aos discos de vinil. Para ajudar sua mãe no trabalho de casa, Durval decide contratar uma empregada, sendo que o baixo salário acaba atraindo Célia (Letícia Sabatella), uma estranha candidata que chega junto com Kiki (Isabela Guasco), uma pequena garota. Após alguns dias de trabalho Célia simplesmente desaparece, deixando Kiki e um bilhete avisando que voltaria para buscá-la dentro de alguns dias. Durval e Carmita ficam surpresos com tal atitude, mas acabam cuidando da garota. Até que, ao assistir o telejornal, mãe e filho ficam cientes da realidade em torno de Célia e Kiki. O filme conta com participações de Marisa Orth e Rita Lee. Apesar do áudio 2.0, o formato de tela é widescreen, e, como extras, além de cenas excluídas, trailer e videoclipes, vem um ótimo documentário de 25 minutos, mostrando todo o processo de criação da fita, da escolha das locações até a montagem final. Confira!

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Filme de Arte: “Amen”

Kurt Gerstein (Ulrich Tukur) é um oficial do Terceiro Reich, que trabalhou na elaboração do Zyklon B, gás mortífero originalmente desenvolvido para a matança de animais, mas, usado para exterminar milhares de judeus, durante a 2ª Guerra Mundial. Gerstein se revolta com o que testemunha, e, tenta informar os aliados sobre as atrocidades nos campos de concentração. Católico, busca chamar a atenção do Vaticano, mas suas denúncias são ignoradas pelo alto clero. Apenas um jovem jesuíta lhe dá ouvidos, e, o ajuda a organizar uma campanha, para que o Papa (Marcel Iures) quebre o silêncio, e, se manifeste contra as violências ocorridas em nome de uma suposta supremacia racial. O filme ganhou o César, o Oscar europeu, de Melhor Roteiro, além de ter sido indicado para Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator (Mathieu Kassovitz), Melhor Fotografia, Melhor Trilha Sonora e Melhor Som. Em sessão única do Filme de Arte do Cine Natal 1, na terça-feira, dia 4, às 21h.


O Brasil em Cannes


Até o dia 23 de maio, acontece na França o mais charmoso de todos os festivais de cinema, o Festival Internacional de Cinema de Cannes. A 57ª edição do festival inova este ano, com um bom número de filmes de fora da Europa. Dos dezoito filmes que participam da mostra competitiva, seis são de diretores asiáticos, e, dois de latino-americanos. O brasileiro Walter Salles concorre com seu “Diários de Motocicleta”, road-movie sobre a juventude de Che Guevara, embora não esteja entre os favoritos. “Quimera”, de Erik Rocha e Tunga, concorre ao prêmio de melhor curta-metragem. “O Pagador de Promessas”, de 1962, foi o primeiro, e, até agora, o único filme brasileiro a ser premiado com a Palma de Ouro no Festival de Cannes.


Fernanda Montenegro ganha prêmio internacional

Nossa grande dama do cinema, Fernanda Montenegro, que já foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz, por “Central do Brasil”, ganhou o prêmio, na mesma categoria, no Festival de Tribeca, realizado em Nova York, que privilegia filmes de diretores estreantes. A premiação da atriz foi em “O Outro Lado da Rua”, drama policial, também estrelado por Raul Cortez, que estréia nacionalmente no dia 28 de maio. Outro brasileiro premiado no festival foi Paulo Sacramento, que ganhou o prêmio de melhor diretor de documentário, por “O Prisioneiro da Grade de Ferro”, sobre o lendário presídio de Carandiru, realizado pouco antes de sua desativação.


Filme recomendado: “Nascido para Matar”

Nascido para endoidar...

Eu queria encontrar pessoas estimulantes e interessantes de uma civilização antiga e matá-los. Eu queria ser o primeiro garoto do meu quarteirão a conseguir uma morte confirmada...
Entrevista do recruta Joker à equipe de televisão


Em meio aos noticiários do mata-mata de americanos e iraquianos, além das recentes denúncias de torturas nas prisões, inflingidas exatamente por quem se julga o detentor da moral do mundo, um filme parece muito apropriado para revisitar. É um dos melhores trabalhos de Stanley Kubrick: “Nascido para matar”, que fala sobre a guerra do Vietnã.

A guerra, que é pano de fundo para o filme, ocorreu no Vietnã, entre o fim dos anos sessenta, e, começo dos setenta. Antiga colônia francesa, chamada Indochina, o país travou uma sangrenta luta de libertação com a França, entre 1946 e 1954, depois de quase um século de ocupação. Além de ter perdido a colônia, a França ainda teve cem mil soldados mortos, e, cento e quinze mil feridos. O Vietnã foi então dividido em dois, ficando o Norte na influência comunista, e, o Sul, apoiado pelos Estados Unidos.

A partir de 1961, devido à fraqueza e a corrupção do totalitário governo de Ngo Dinh Diem, os americanos começaram a participar, além de armamentos, como “consultores militares”. De mero argumento da campanha de Kennedy (que seria convenientemente “esquecido” após uma mais que provável reeleição), virou ponto de honra para o governo de Lyndon Johnson, após a morte do seu carismático antecessor. Entre 1965 e 1973, houve participação ativa do exército americano no Vietnã, chegando a 2,7 milhões de jovens americanos. Morreram 57.939 soldados dos Estados Unidos, 180.000 sul-vietnamitas, e, 900.000 norte-vietnamitas, entre soldados e civis. Mais de um milhão de crianças ficaram órfãs, e, os soldados americanos deixaram cerca de 200.000 crianças ilegítimas. Em 1975, foi selada a vitória, com a reunificação do país.

Os grandes responsáveis pela vitória vietnamita foram os vietcongues, que utilizaram com sucesso táticas de guerrilha na selva nunca antes observadas em guerras tradicionais. Os guerrilheiros chegaram a escavar uma malha de túneis com mais de trezentos quilômetros.

Muitos filmes foram feitos sobre a guerra do Vietnã, mas a maioria não passa de fantasia, de quem quer ganhar, no cinema, o que foi perdido, de fato. Geralmente são filmes de segunda linha, como os Bradock’s de Chuck Norris e outros do gênero. Os mais interessantes, são os que encaram o conflito pela ótica de quem estava na linha de frente. Podem ser citados “Platoon”, “Apocalipse Now”, “Franco-Atirador”, “Amargo Regresso”, e, entre os bons exemplos, “Nascido para Matar”.

Este filme foi realizado em 1985, dez anos após o término do conflito. “Nascido para Matar” foi dirigido e produzido por Stanley Kubrick, que também escreveu o roteiro, junto com o autor da história original, Gustav Hasford. Hasford foi fuzileiro, e, serviu no Vietnã como correspondente de guerra. Sua vivência pessoal permitiu criar o recruta Joker ( traduzido como “Hilário”).

O filme de Kubrick é dividido em dois atos. Na primeira parte, é mostrada a fase de treinamento dos recrutas, na ilha Parris, onde um curso de seis semanas os tornaria aptos a partirem para o front. O treinamento (que não deve ser muito diferente em exército nenhum do mundo) transforma seres humanos, normais, e, alienados, em máquinas de matar, verdadeiros zumbis, prontos a entrar em ação, a partir da ordem do superior. Para fazer isso, os recrutas contaram com o auxílio do “simpático” sargento Hartman ( R. Lee Ermey, que foi realmente instrutor de um campo de recrutas, e, lutou no Vietnã), que submetia o grupo e principalmente o moleirão Leonard (que ganhou do sargento o apelido de Gomer Pyle, um personagem humorístico da tv americana) a uma pressão intolerável. A loucura do treinamento foi expressada na loucura do recruta, numa recriação da imagem de Frankenstein.

A segunda parte do filme passa-se no Vietnã. Entre a convivência com um povo (literalmente) prostituído pelos americanos, e, luta com um inimigo invisível, a preocupação era uma só: conseguir voltar para casa inteiro. O clímax desse ato passa-se num vilarejo abandonado onde um franco-atirador põe toda a companhia em pânico. É a loucura da guerra, traduzida na soma das loucuras individuais.

O elenco está muito bom, não apenas Modine, num dos seus primeiros papéis importantes, como o já citado Ermey, e, Vincent D’Onofrio, que faz uma fantástica caracterização como o frágil Gomer Pyle. É dele, a citação que dá o título original ao filme: full metal jacket. Para os leigos em armamentos, full metal jacket é o tipo de projétil utilizado pelo exército, onde a ponta é revestida por um metal duro, com alma de chumbo, dotada de grande poder de perfuração.

A edição latina em DVD traz áudio remasterizado em inglês e francês Dolby Digital 5.1. As legendas estão disponíveis em português, inglês, francês e espanhol. O formato de tela é Full Screen, mas, segundo os críticos, este era o formato preferido de Kubrick, de forma que a perda não deve ser grande. É uma pena não vir nenhum extra no disco, pois este faz parte de um conjunto sobre a obra de Kubrick que condensou os documentários num disco à parte.

No mundo pós 11 de setembro, há uma vigorosa semelhança entre o antigo Vietnã e o atual Iraque, onde o ódio aos invasores só se iguala à prepotência e agressividade dos invasores. “Nascido para Matar” tem seu valor, por mostrar que qualquer guerra é uma soma de loucuras. Políticas, ideologias, ambições ou fanatismos, a coisa resume-se numa profunda conclusão filosófica: guerra é coisa de doido!

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